sábado, novembro 10, 2012

da Vida e da Morte com ...

Rosa Lobato Faria.

Extrato da entrevista (uma das últimas da escritora) feita a propósito do lançamento do livro Alma Trocada e publicada na Notícias Magazine de 30 de Setembro de 2007 - uma delícia!

Tenho impressão que sei até onde posso ir, e não é muito longe», dizia aos 40 anos, em 1973, ao Diário de Lisboa, na altura locutora e declamadora, ainda sem qualquer escrito publicado. Foi mais longe do que pensava ou estava só a ser modesta?
Não, não estava a ser modesta, não sou modesta. O que me aconteceu, e isso não podia prever, foi que ganhei uma nova vida quando descobri que era capaz de escrever romances. Isso só aconteceu em 1994, com o Pranto de Lucífer. Foi um presente que a vida me deu, completamente inesperado, e que me cumulou de felicidade.

Os seus romances são atravessados pela paixão. Os seus personagens amam desesperadamente. A Rosa é uma apaixonada?
A paixão é uma doença, e tenho pena das pessoas que nunca a tiveram, porque é bom tê-la, mas hoje em dia seria uma desgraça apaixonar-me... Outro dia, num programa de televisão em que participei, ligou para lá uma senhora que dizia que nunca tinha tido uma paixão assolapada por ninguém, toda a vida tinha sido felicíssima com o marido, só tinha conhecido aquele homem, e eu tive imensa pena dela porque se não sofreu, não se apaixonou, não chorou de raiva, nem de ciúmes, nem de insegurança, nem de abandono, sabe lá o que é a vida!

No tacanho Portugal dos anos sessenta, casada e mãe de três filhos, decide sair de Évora e ir tirar um curso de guia intérprete em Lisboa e começar a trabalhar. Um escândalo a que se seguiria outro, o da separação.
Eu lia muito e fui percebendo que era uma estupidez aquele tipo de vida, «agora casas-te com este e tens que o gramar para o resto da vida». Tinha três crianças, mas achei que isso não devia ser um obstáculo a que eu vivesse a minha vida, até porque os meus filhos seriam mais inteligentes e menos preconceituosos se rompesse com aquelas regras sem sentido. Tinha que experimentar as minhas próprias asas e saber quem era e foi o que fiz. Não foi fácil.

Descobriu quem era?
Levei tempo... mas hoje sei quem sou.

Não se leva demasiado a sério?
Não, em nada.

E quando desce (do "seu mundo"), como vê a situação actual do país?
Com um enorme sentido de humor. Ou a gente se suicida ou vê com humor. Não há alternativa.

Tem consciência da leveza com que fala dos livros?
Nada é muito importante, para dizer a verdade. Nem a morte, excepto talvez a morte dos outros, mas a própria morte não tem importância nenhuma.

Não tem medo da morte?
Nenhum.

Já disse que era uma mulher muito bonita e despertou muitas paixões. Como tem lidado com o envelhecimento?
Muito bem. Tenho muitas teorias (ri), para tudo tenho teoria, e uma delas é que a mulher e o homem têm de ser lindos é na idade fértil porque faz tudo parte de um plano universal para a reprodução da espécie. Claro que disfarçamos com um jantar à luz das velas, etc., mas no fim vai tudo dar ao mesmo: os homens – por isso é que não acredito muito na monogamia – têm de espalhar o seu sémen no máximo de fêmeas possível – coitados, uns lá se contêm, outros não – e as mulheres a mesma coisa, no tal plano universal a mulher gostaria de ser fecundada pelos melhores machos para ter os melhores filhos. A sociedade é que não permite nada disso. Portanto, quando acaba a idade fértil, para quê fazer operações para fingir que se é nova? É ridículo. Fisicamente, cai tudo um bocado, mas em compensação ganha-se serenidade, inteligência, humor, e uma tranquilidade perante a morte que não tínhamos quando éramos novas.

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